quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Da tristeza e do desespero...

Há algum tempo que essa história me atormenta de tempos em tempos e acredito ser necessário escrevê-la. Já o deveria ter feito, mas sempre me faltam as palavras. Escreverei agora não por quê as palavras me tenham vindo, mas simplesmente por que elas, acredito eu, nunca o farão.

Era um dia normal, estava dirigindo para a casa da minha namorada na época. Atravessava distraidamente o costumeiro engarrafamento da avenida das américas naquela noite amena como o fiz em tantas outras. Paramos em um dos sinais vermelhos e eu vi à minha esquerda uma das cenas mais chocantes da minha vida. Não sei exatamente o que diferia aquele menino de todos os outros, mas algo o fazia. Ele estava sentado no meio-fio de um dos cruzamentos onde, acredito eu, ele pedia esmolas. Ele chorava. Sua testa suada apertada contra os joelhos ossudos na posição fetal mais deprimente que já vi. Suas costas arqueavam com os soluços intermitentes enquanto os carros passavam do seu lado ignorando seu sofrimento. Devia ter no máximo dez anos e estava, ao que me pareceu, sozinho.
Até aí tudo bem. Não me leve a mal, mas só isso não é o suficiente para marcar uma impressão tão profunda. A questão foi que eu parei pra pensar. Nos quinze segundos que devo ter passado observando o menino me ocorreu que talvez a mãe daquele menino tivesse acabado de morrer. Ou seu melhor amigo. Ou seu cachorro, sei lá. Porra, talvez o cachorro fosse seu melhor amigo. Ou talvez ele só tivesse olhado pra si e pro mundo e sentido o peso da nossa sociedade. Por algum motivo aquele menino me pareceu a figura mais solitária do universo. Ele não tinha absolutamente ninguém. Ninguém, eu disse. Não havia quem ouvisse seu choro nem que fosse para se irritar com ele e mandá-lo calar a boca. Era ninguém e não tinha ninguém. Nada.
Olhei pra mim mesmo, sentado no meu carro com a minha namorada sentada ao meu lado. Olhei pra ela e olhei pra todos os carros e todo mundo que vivia sua vida normal. A tristeza mais estranha se abateu sobre mim e me desesperei pelo menino. Queria fazer algo por ele. Acho que no fundo queria pedir desculpas, não sei. Peguei então o primeiro retorno e fui até a casa do alemão comprar um sanduíche e alguns salgados para dar de presente para ele. Devo ter demorado uns vinte minutos para voltar ao cruzamento onde o tinha avistado mas ele não estava mais lá. Procurei em outros cruzamentos e sinais mas não consegui encontrá-lo. Terminei na casa da minha ex com o sanduíche na mão e o coração pesado na outra. Me sentia culpado pelo sofrimento do menino. Sei lá, com certeza sou culpado também. Já derramei algumas lágrimas tímidas, não sei se pelo menino em si ou pelo que ele representa. De qualquer forma esse texto não muda nada. Não faz mais do que aliviar o peso na minha alma. Egoísta, patético, ignorante. Não somos todos?

Eu poderia ter enfeitado esse texto com metáforas e palavras rebuscadas ao invés de tê-lo escrito em dez minutos. Acredito, no entanto, que o menino visceral merecia também um texto visceral. Mais do que visceral, na verdade, eu diria honesto. O máximo que posso oferecê-lo é essa parcela ínfima de honestidade.

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