quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Do tempo...

Que dizer do tempo que já não tenha sido dito em outro momento? Este tempo que não para ou que nunca começou (como saberíamos?). De qualquer forma, me peguei hoje a pensar: que é o tempo? Paradoxalmente, me sinto preso em um momento que não passa e, para o meu desespero, no entanto, parece se acelerar cada vez mais depressa. Me sinto preso dentro de um trem a toda velocidade mas desconheço minha situação. Dentro do trem está tudo calmo e sereno mas do lado de fora o vento corta violentamente as suas ferragens. Para onde vai esse trem? Estaria em rota de colisão? Como pará-lo? Ou, mais importante, me parece, como assumir o controle do seu destino?

São 2 da manhã e uma tosse violenta não me deixa dormir. De fato, Heidegger estava certo: estamos em maior conexão com o tempo quando imersos no tédio.

terça-feira, 16 de setembro de 2014

Do porte de arma...

Segurança é produto de uma sociedade igualitária, mas do ponto de vista social e cultural. Não do bélico.

terça-feira, 15 de julho de 2014

Da bobeira...

Tenho aqui duas mão
Cada qual segura uma metade
Do meu coração

sábado, 5 de julho de 2014

Do abandono...

Deixaste, amor, o leite fora da geladeira
Azedou
Deixaste, amor, a pasta sem tampa
Secou
Deixaste, amor, a comida no fogo
Queimou
O coração que deixaste sem amor, amor
Gelou

Deixa, portanto, a minha vida. O inverno está aí, e de frieza já estaremos fartos.

quinta-feira, 12 de junho de 2014

Da reflexão forçada...

As coisas que surgem
Nem todas tem nome
A maioria, inclusive
É sem sobrenome

Chegam assim
Sem saber o que são
Quando dão por si
Aqui já estão

Menos significante
Mais significado
Mais agonizante
Menos equilibrado

Não sei se liberdade
É sinônimo de incerteza

Sei que gosto de ti
E faço o que for
Pois paixão sem nome
Não é menos amor

quinta-feira, 20 de março de 2014

Das mulheres...

Há um tempo que eu tenho essa teoria e aproveitando a visita da fada da insônia resolvi sentar aqui e ver se escrever os meus pensamentos pode me retornar o sono como o fazia outrora.

Toda mulher tem uma coisa. É sempre uma e não mais.

Veja bem, toda mulher tem várias coisas, mas existe sempre aquela que há de unificar todas as outras coisas. Aquela característica que se sobressai à todas as outras e que faz com que você se apaixone perdidamente, ou não. Aquela idiossincrasia que te faria atravessar um mar a nado com os pés amarrados. Aquele detalhe que mexe com o seu interior sabe-se lá por que diabos.
Perceba que Maria tem um sorriso lindo, umas pernas de enlouquecer qualquer cristão e uma voz doce de jabuticaba. Mas aquela pinta no rosto... Puta que pariu, aquela pinta mexe comigo.
Joana tem os cabelos mais lindos que já vi e olhos que penetram fundo como a perscrutar a alma incauta. Mas aqueles lábios... Puta que me pariu, aqueles lábios não existem.
Veja bem, cada mulher é infinita. Cada indivíduo enxergará cada mulher de uma forma diferente e verá o "uma coisa" diferente. Assim, existe a Joana dos lábios para um e a Joana das sobrancelhas para outro. Pode ser a Maria que pronuncia os "R"s de um jeito engraçado ou a Maria que já leu todos os livros do Simenon. Invariavelmente, no entanto, todas terão A coisa. Pode ser algo pequeno ou grande, realmente não importa. A questão é apenas que essa coisa identifica a mulher no meio de todas as outras. É como aquela pequena parcela de individualidade inexorável; uma impressão digital da alma, vá lá, se quisermos ser poéticos. É a gota d'água que faz o copo transbordar; é o golpe de misericórdia no coração distraído.

Descubra, portanto, A coisa da sua mulher. Pelo tempo em que essa coisa te exercer fascínio, não se preocupe. Você ainda está apaixonado.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Acaso


Caminhava pela madrugada de Berlim, perdido entre as strasses e o único ponto de referência que possuía: uma alta torre de rádio na Alexander Platz. A brilhante idéia de caminhar pouco agasalhado para o albergue no ar de 1 grau após a falha tentativa de encontrar o trem certo na estação central não parecia mais tão interessante. Apesar de caminhar à noite por ruas desertas de cidades ser um dos meus programas preferidos, a bexiga expandida impedia qualquer desfrutamento. De fato, em quaisquer outras circunstâncias eu estaria adorando a situação. A situação piorava quando eu perdia a torre de vista, ocultada pelos outros prédios, o que me obrigava a seguir apenas o meu senso de direção. Que fique claro que eu me perco até com guia. A caminhada que eu estimei em 10 minutos acabou levando algo em torno de 1h e meia, entre as tantas idas e vindas. Quando eu havia finalmente encontrado os arredores do albergue já passava da meia noite e, virando em uma esquina que anunciava o lançamento do novo video-game de ultima geração algo me chamou a atenção. Era uma igreja linda, e não pude deixar de observá-la por alguns instantes. Me vi dividido entre a bexiga e a beleza da igreja e imaginei que talvez fosse uma boa idéia pedir uns trocados na rua para conseguir pagar o banheiro público e poder admirar com calma aquela maravilha. As constantes viaturas me deixaram inibido para atender às minhas necessidades em uma moita qualquer. Fui até a esquina e comecei a abordar os transeuntes com uma moeda em uma mão e na outra a pergunta: "excuse me, could you change 2 euros for me?". Não consegui deixar de rir dos olhares de reprovação dos casais alemães que apressavam o passo após a minha delicada abordagem. Digamos apenas que não foram poucos. Eventualmente, no entanto, um grupo de texanos se solidarizou com a minha causa e me doou 50 cents. Talvez tenham ficado com pena de meus prováveis problemas mentais quando expliquei que só queria olhar a igreja mas precisava ir no banheiro antes. Resolvida a situação, acendi um cigarro e me acomodei na calçada oposta à igreja. Deitei no chão pra poder vê-la melhor, já que era muito alta. Devo ter passado algo em torno de uma hora com as mãos e as nádegas congeladas tentando descobrir o que tanto me atraíra naquela igreja. Ela era linda e monumental, sim, mas havia algo a mais. Percebi então que não havia deitado exatamente em frente a ela, como planejado. Eu estava um pouco à esquerda, fazendo com que todas as medidas e perspectivas rigorosamente planejadas e tão valorizadas séculos atrás se apresentassem meio enviesadas. Foi então que entendi. A igreja me lembrava ela: a menina do sorriso torto.

Viva o acaso.